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O DESASTRE, OU ROUBO, DE 47 BILHÕES

  • Foto do escritor: Tadeu Cruz
    Tadeu Cruz
  • 19 de fev. de 2023
  • 9 min de leitura

Tadeu Cruz



Vocês já ouviram falar de algum bilionário que, detendo 41% de uma das suas empresas, não sabe o que está acontecendo com uma delas?


Já ouviu falar de três bilionários que não sabem que uma das empresas, na qual têm participação acionária significativa, tinha um rombo de 47 bilhões?


E já ouviram falar de um bilionário, responsável por uma empresa, junto com alguns filhos de outros bilionários, que não faz a menor ideia de onde foi parar os 47 bilhões da empresa que ele é o responsável?


Como é? Vocês já souberam de alguma coisa assim? A não ser, é claro, em algum filme de Hollywood?


Pois é, atendendo a alguns pedidos, vou colocar meu ponto de vista sobre a tragédia das Americanas. Tragédia, sim, porque um rombo de 47 bilhões é algo que foge ao racional. Beira ao absurdo. Até pode não ser uma tragedia para os três maiores acionistas, mas seguramente é para os funcionários, suas famílias, para os credores e para todos que caíram no golpe.


Foi exatamente isso que aconteceu com a Lojas Americanas (AMER3), um dos maiores escândalos financeiros no Brasil nos últimos anos, 4º maior da história no Brasil – a maior crise em quase seis décadas de sociedade entre Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira. Os três juntos têm fortunas que juntas somam mais de R$ 185 bilhões.


A crise na Americanas causou um racha entre Lemann, Telles e Sicupira, amigos de longa data e acionistas da Americanas. Segundo informações divulgadas na terça, 07/02/2023, já existiam divergências dentro do trio sobre os rumos da varejista. Agora, um dos sócios, Sicupira, vem sendo apontado como o culpado pelo atual estado de caos da empresa. De acordo com a apuração do jornal Valor Econômico, Telles já teria dito aos sócios que era contra seguir investindo na Americanas pois a empresa apresentava “resultados medíocres” para os seus padrões. Há alguns anos, o executivo defende que o trio deveria vender sua parte do negócio. Agora, com a crise, ele passou a apontar Sicupira como o culpado pelo rombo de 47 bilhões.


No trio dos acionistas, Sicupira ficou encarregado da Americanas, enquanto Telles foi o responsável pela fusão entre a Brahma e a Antarctica, fusão esta que deu origem à Ambev, e Lemann, como maior fortuna entre os três, de mandar em tudo.


Jorge Paulo Lemann se arrepende de não ter conseguido vender a varejista, pois não mostrava entusiasmo pelo negócio, que julgava ser mal gerido. A empresa chegou a ser oferecida para Abilio Diniz, mas o ex-líder do Pão de Açúcar não quis.


Aliás, recentemente Abilio Diniz disse que “Nem o trio da Americanas deve saber o que está acontecendo lá dentro”, e acrescentou:


“Não falo sobre esse caso por dois motivos. Primeiro, os acionistas (Lemann, Telles e Sicupira) são meus amigos de décadas. Até falei com eles mostrando solidariedade, mas nem eles devem saber o que está acontecendo lá dentro. Não tenho as informações, o caso é muito complexo e não quero cometer leviandade”, disse Diniz, sendo elegante, em entrevista na terça, 31/01/2023.


Ah, e mais um ponto que quero ressaltar. Os funcionários da Americanas, ouvidos há tempos pelo jornal O Globo, disseram que quem dava as ordens na empresa era o Sicupira. Eles disseram textualmente que “se algo tinha que ser feito era só dizer “ordem do Beto””.


Aliás, quando ocorrem terremotos deste tipo em organizações geridas por pessoas, até então tidas como ilibadas, vêm à tona revelações nunca relevadas, escondidas, em função da fama dos gestores, tidos como verdadeiros midas, pelo “mercado”.


O jornalista Luiz Nassif publicou no “Jornal GGN”, em 17 de fevereiro de 2023, a seguinte matéria: “Os casos ALL (ferrovia do Atlântico), Kraft Heinz, Eletrobras e, agora, as Americanas expuseram de forma implacável o estilo 3G – de Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles.


De início, apresentado como um estilo inovador, o trio, depois do desfecho do caso Americanas, revelou-se um estilo predatório, pois não vêm a empresa como um ecossistema, cuja sustentabilidade depende do aprimoramento e das relações de confiança com fornecedores, terceirizados, funcionários, entorno, mas como uma máquina de gerar dividendos. Este passa a ser o único objetivo, em detrimento de investimentos em ampliação, pesquisas, inovação. Tudo se torna um jogo selvagem de comprometer o futuro da empresa em troca de resultados imediatos e do uso de toda forma de truculência nas relações empresariais e laborais”. Finaliza Luiz Nassif.


O mercado não perdoou o desfalque de 47 bilhões.


“A Americanas arquitetou uma fraude colossal perpetrada por uma quadrilha”, disse Ricardo Lacerda, presidente do BR Partners, um banco de investimento com sede em São Paulo, um dos fundos que teve prejuízo com o roubo.


Bom, tudo que eu expus até aqui creio que vocês já leram ou ouviram, em maior ou menor profundidade, na imprensa escrita, falada, televisada, etc. Por isso quero abordar uma outra vertente do mesmo desastre, a das leis, regulamentos e obrigações que uma empresa com ações na bolsa, tanto brasileira quanto americana, tem que obedecer. Sim, a Americanas tem papeis na Bovespa e em Wall Street.


O que uma empresa com papeis em bolsa tem que obedecer? Como deve ser sua administração?


Vamos começar pela Lei Sarbanes-Oxley.


Vocês já ouviram falar de SOx?


Em 2002, o Congresso Americano aprovou a Lei Sarbanes-Oxley, também conhecida como Lei SOX, cujo objetivo consiste em proteger os acionistas e o público em geral de erros contábeis e práticas fraudulentas nas empresas, principalmente as com ações em bolsa, (exatamente o que aconteceu com a Americanas), contribuindo para uma maior precisão na divulgação de dados e informações corporativas.


Os congressistas Paul Sarbanes e Michael Oxley redigiram a lei com o objetivo de melhorar a governança corporativa e a responsabilidade dos executivos, à luz dos escândalos financeiros que ocorreram na década de 2000 em empresas como a Enron Corporation, uma empresa de energia, commodities e serviços baseada em Houston, Texas. Em um dos mais controversos escândalos contábeis década, descobriu-se em 2001 que a empresa estava usando lacunas contábeis para esconder bilhões de dólares de dívidas incobráveis ao mesmo tempo em que inflacionava os ganhos da empresa, (será que foi isso que aconteceu com a Americanas?). O escândalo resultou em acionistas perdendo mais de US $ 74 bilhões, enquanto o preço da ação da Enron caiu de cerca de US $ 90 para menos de US $ 1 em um ano, o que ocasionou sua falência. A empresa que auditava a Enron era a Arthur Andersen. a WorldCom também fez uma série de maracutaias e também faliu. A empresa que auditava a WorldCom era a Arthur Andersen. Tyco outro rombo bilionário. A empresa que auditava a Tyco era a Arthur Andersen. Desde então, todas as empresas listadas na Bolsa de Valores Americana devem cumprir a Lei SOx, incluindo as empresas brasileiras listadas no mercado norte americano de ações, como Petrobras, Vale e Ambev. As consequências para o descumprimento da legislação incluem multas, prisão ou ambos.


Dentre os pontos mais importantes da Lei Sarbanes-Oxley, destaco:


A seção 302 determina que as empresas devem certificar que:


Os relatórios e demonstrações financeiras foram revisados e aprovados nos controles internos nos últimos 90 dias. Não parece ser o caso da Americanas.


Os relatórios e demonstrações financeiras não contêm declarações falsas ou omissões. Não parece ser o caso da Americanas.


Os relatórios e demonstrações financeiras representam fielmente a saúde e a posição financeira da empresa. Não parece ser o caso da Americanas.


Os relatórios e demonstrações financeiras devem ser acompanhados de uma relação com todas as deficiências ou alterações nos controles internos e informações sobre eventuais fraudes envolvendo colaboradores da empresa. Não parece ser o caso da Americanas.


Seção 401


Por sua vez, a seção 401 determina que as demonstrações financeiras devem ser precisas, apresentando quaisquer passivos, transações ou obrigações fora do balanço. Não parece ser o caso da Americanas.


Seção 404


Outro ponto importante da Lei Sarbanes-Oxley é a seção 404 que determina que as empresas devem publicar uma declaração detalhada em seus relatórios anuais explicando e avaliando a estrutura de controles internos utilizada. Não parece ser o caso da Americanas.

Por sua vez, o escritório de contabilidade que audita as demonstrações também deve avaliar os controles internos como parte do processo de auditoria. Não parece ser o caso da PricewaterhouseCoopers.


Seção 409


Já a seção 409, determina que as empresas são obrigadas a divulgar de forma imediata, clara e inequívoca mudanças drásticas em sua posição financeira ou operações, incluindo aquisições, desinvestimentos e grandes saídas de pessoal. Não parece ser o caso da Americanas.


Seção 802


Por fim, a seção 802 lista penalidades para aqueles que descumprirem a Lei Sarbanes-Oxley:


Funcionários responsáveis por ocultar, destruir ou alterar documentos, com a intenção de interromper uma investigação, podem ser punidos com multas e até 20 anos de prisão.


Contadores que ajudem os funcionários da empresa a destruir, alterar ou falsificar demonstrações financeiras podem ser punidos com até 10 anos de prisão.


Com a implantação da Lei SOx, o número de crimes financeiros e fraudes contábeis diminuiu de forma significativa.


Na prática, os custos com multas e as penas aplicáveis aos infratores excedem os possíveis benefícios de distorções e manipulações nos números e resultados de uma Companhia.

Sendo assim, os investidores passariam a ter acesso a informações mais confiáveis, antes de tomar suas decisões.


O trio Americanas


Os 3 homens mais ricos do Brasil e articuladores do maior golpe financeiro da história do Brasil, se forem processados nos EUA, poderão ser condenados e presos, mesmo devolvendo os R$ 47 bilhões que desviaram das Lojas Americanas, algo, que diga-se de passagem é improvável.


Também a PricewaterhouseCoopers, empresa de auditoria que encobriu a fraude, será responsabilizada e punida. Claro, nos Estados Unidos, não aqui.


Fonte do JORNAL DO BRASIL em Nova York diz que os credores não acreditam mais na possibilidade de ter seus direitos resguardados pela justiça brasileira, depois de serem informados que o irmão do ex-presidente do Tribunal de Justiça do Rio foi contratado para representar a Lojas Americanas no processo de Recuperação Judicial: “sabemos como funciona o sistema judicial no Brasil. Nossos clientes querem processar Lemann, Sicupira e Telles, assim como a PwC, nos EUA”, assegurou um representante de um dos fundos de investimentos que sofreram prejuízos com o roubo.


Esses processos já começaram a ser articulados, e serão protocolados no Tribunal de Nova York, por fundos de investimentos que viram as centenas de milhões de dólares investidos em ações das Lojas Americanas virarem pó, depois da descoberta da fraude.


Nossa justiça desacreditada já aponta uma enorme pizza, na responsabilização dos ladrões. Aliás, o STF já mandou a justiça de São Paulo suspender o acesso às contas de e-mails dos três bilionários, como havia ganho, também na justiça, o Bradesco numa ação movida para tal. Todos nós, brasileiros, e agora também os estrangeiros, sabemos como terminam esses roubos bilionários. e como a justiça brasileira trata os poderosos.


Outro ponto de atenção, e do qual ninguém ainda falou é sobre a:


Política de Compliance.


O termo compliance vem do inglês “to comply” e significa estar em conformidade. Na prática, o compliance tem a função de proporcionar segurança e minimizar riscos de instituições e empresas, garantindo o cumprimento dos atos, regimentos, normas e leis estabelecidos interna e externamente.


Com a recente eclosão de operações de desmantelamento de esquemas de corrupção, o termo “compliance” está cada vez mais presente no vocabulário de empresários brasileiros. A difusão do termo se fortaleceu depois da promulgação da Lei n° 12.846/13, conhecida como Lei Anticorrupção e de sua regulamentação pelo Decreto n° 8.420/15.


O que é compliance em empresas?


Compliance vem do verbo em inglês “to comply”, que nada mais é do que estar em conformidade com as leis, padrões éticos, regulamentos internos e externos. Sua função é minimizar riscos e guiar o comportamento de empresas diante do mercado em que atuam.


Nas palavras de Marcos Assi (2013), é “um sistema de controle interno que permite esclarecer e proporcionar maior segurança àqueles que utilizam a contabilidade e suas demonstrações financeiras para análise econômico-financeira.”


Assim, uma definição simples para entender o que é compliance é pensar nele como um padrão básico de negócios. Ou seja, são ações colocadas em prática voltadas a garantir relações éticas e transparentes entre empresas e, principalmente (mas não somente) o Poder Público.


Outro ponto importante: O Código de Ética da Organização.


O Código de Ética é um documento que busca expor os princípios e a missão de uma determinada profissão ou empresa. Seu conteúdo deve ser pensado para atender às necessidades que aquela categoria serve e representa. Ele é feito para enfatizar os valores que devem ser praticados pelos profissionais e instituições. Pode-se falar também em código deontológico. A deontologia é a ciência que estuda os deveres e obrigações a partir da ótica moral e ética. Em geral é baseado na legislação vigente do país, na Declaração dos Direitos Humanos, nas Leis Trabalhistas e em outras.


Principais Objetivos de um Código de Ética


  • Especificar os princípios de uma certa instituição e/ou profissão diante da sociedade;

  • Documentar os direitos e deveres do profissional;

  • Dar os limites das relações que o profissional deve ter com colegas e clientes/pacientes;

  • Explicar a importância de manter o sigilo profissional (essencial em muitos casos);

  • Defender o respeito aos direitos humanos nas pesquisas científicas e na relação cotidiana.


Resumindo, a SOx, as políticas de compliance e o código de ética não serviram para evitar o roubo de 47 bilhões de reais na Americanas. Isso numa empresa governada por um trio que já foi considerado detentor do Santo Graal Organizacional. Um trio que durante muito tempo foi paradigma das boas práticas e dos bons costumes empresariais, junto com figuras emblemáticas do século XX, como Jack Welch.


Face ao que expus neste artigo, ficam as seguintes perguntas, ainda sem respostas:


1. Quem roubou os 47 bilhões?

2. Quem encobriu um roubo tão grande assim?

3. Porque foi preciso contratar um executivo com a função de trazer o rombo ao conhecimento de todos, que, aliás, só descobriu 20 bilhões, quando o rombo era mais que o dobro?

4. Como ninguém viu o roubo de 47 bilhões?

5. O que levou a PricewaterhouseCoopers a se mancomunar com os ladrões?

E, por fim...

6. Onde foram parar os 47 bilhões?


E as últimas, mas não menos importantes.


  • Por que nos deixamos levar por esse tipo de “executivos”, embotados que ficamos até que tais tragedias vêm à tona? Quando ao acordarmos é sempre tarde demais.

  • Para que servem a SOx, a Política de Compliance, o Código de Ética se já há a disposição para roubar?

 
 
 

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